A preservação e o conceito tradicional de patrimônio
Preservação
"manutenção no estado da substância de um bem e a desaceleração do processo pelo qual ele se degrada."
Concepção restrita e limitada do patrimônio
"coleção de objetos", identificados e catalogados por peritos, como representantes significativos da arquitetura do passado e, como tal, dignos de preservação, passando os critérios adotados aqui pelo caráter de excepcionalidadeda edificação, àqual se atribuía valor histórico e/ou estético
produtos da cultura erudita, derivados via de regra de grupos e segmentos sociais dominantes
Tipo de objeto
Marco legal
o tombamento, instrumento introduzido no Brasil na década de 30, pensado inicialmente para proteger bens excepcionais
Tipo de ação
predomínio do Estado
Tipo de profissionais envolvidos: majoritariamente arquitetos e historiadores
Quando se pensa em preservar, alguém logo aparece falando em patrimônios e tombamentos. Também se consagrou a crença de que cabia ao governo resguardar o que valia a pena. Como? Através de especialistas que teriam o direito (o
poder-saber) de analisar edifícios e de pronunciar veredictos. Esses técnicos praticariam uma espécie de ação sacerdotal. Atribuíam caráter distintivo a um determinado edifício e logo tratavam de sacralizá-lofrente aos respectivos contextos profanos.
(Carlos Nelson Ferreira dos Santos, "Preservar não étombar, renovar não épôr tudo abaixo", 1986)
Conceito de patrimônio
ampliação
Patrimônio arquitetônico
tanto o conceito de
arquitetura, quanto o próprio campo de estilos e espécies de edifícios considerados dignos de
preservação expandem-se paulatinamente (tripla
expansão desse conceito: cronológica, tipológica e geográfica.
Patrimônio cultural
Antropologia - a noção de
cultura deixa de se relacionar exclusivamente à
chamada cultura erudita, passando a englobar também
as manifestações populares e a moderna cultura de massa.
Tipo deobjetodo monumento isolado a grupos de edificações históricas, à paisagem urbana e aos espaços públicos.
Patrimônio ambiental urbano
não se pensa apenas na edificação, no monumento isolado, testemunho de um momento singular do passado, mas torna-se necessário, antes de mais nada, perceber as relações que os bens naturais e culturais apresentam entre si, e como o meio ambiente urbano éfruto dessas relações.
Conservação
o termo conservação designaráos cuidados a serem dispensados a um bem para preservar-lhe as características que apresentem uma significação cultural. De acordo com as circunstâncias, a conservação implicaráou não a preservação ou a restauração, além da manutenção; ela poderá, igualmente, compreender obras mínimas de reconstrução ou adaptação que atendam às necessidades e exigências práticas. (Carta de Burra, ICOMOS, 1980)
complementando o entendimento sobre Patrimônio
Este trabalho pretende mostrar a trajetória do conceito de Patrimônio,
desde as noções iniciais com a Revolução
Francesa, depois a mudança para Monumento e e o rápido retorno para novamente
Patrimônio, assim como seu uso pelo Estado para construção das identidades
nacionais, o alargamento do conceito com novos objetos, chegando até os dias
atuais. Procura-se conceituar o Patrimônio e ao mesmo tempo mostrar esta
trajetória no decorrer do tempo a partir do século XVIII. Também é levada em
consideração a situação do Brasil, que tem no movimento modernista e no Governo
Vargas o marco inicial da discussão das ideias sobre Patrimônio.
Palavras-chave: Memória, Monumento,
Monumento Histórico, Patrimônio, Patrimônio Histórico.
INTRODUÇÃO
Inicialmente verifica-se que na
construção do conceito de Patrimônio, a palavra está ligada a comunidade
nos finais do século XVIII com a
Revolução Francesa, quando se procura a destruição dos vestígios que ligavam ao
velho regime e também com a guarda de obras em museus, tendo a visão de
atribuir um valor simbólico aos bens guardados e sua utilização com a
denominação de monumento e monumento histórico. Será acompanhado ainda o
desenvolvimento e alargamento do conceito, que inicialmente está ligado a
algumas edificações, templos e castelos, se alargando no final do século XX,
quando vai englobar outros bens intangíveis.
Além de fixar o conceito de patrimônio,
o trabalho em sua segunda parte mostra a trajetória histórica do conceito e
conclui mostrando como se dá este desenvolvimento no Brasil, a partir da semana
de Arte Moderna em 1922 e da implantação de uma nova política para a
conservação do Patrimônio formulada a partir do governo Vargas na década de 30.
1.1
O que é Patrimônio
Quando
se falava em patrimônio, originalmente esta palavra estava ligada a estruturas
familiares, econômicas e jurídicas de uma determinada sociedade estável, com
raízes no tempo e espaço. Com o tempo e diversas variações, o conceito
considerado “nômade”, chega aos dias
atuais com uma trajetória diferente, remetendo a uma instituição e a uma
mentalidade. (CHOAY, 2001, p. 11).
Era
considerado no direito romano, como uma “herança do pai” e podia ser
conceituado, segundo (CASTRIOTA, 2009, p. 83), como “complexo de bens que
tinham algum valor econômico, que podiam ser objeto de apropriação privada.”
Já a expressão Patrimônio Histórico, tem como
referência um bem destinado ao conjunto de uma comunidade, constituindo-se de
uma diversidade de objetos que se conjugam por seu passado em comum, tais como
obras e obras primas das belas artes e das artes aplicadas, trabalhos e
produtos de todos os saberes (CHOAY, 2001, p. 11).
Inicialmente
sua origem no século XVIII está ligada ao desenvolvimento da Revolução Francesa
com a visão de atribuir um valor simbólico aos bens guardados em museus,
enquanto outros eram destruídos por sua
suposta ligação ao regime passado. Inicialmente tratado como patrimônio, logo
em seguida passa a ser denominado como Monumento (CABRAL, 2011, p. 26).
Monumento
é visto como objeto cultural universal com a função de mobilizar a memória coletiva e afirmar a identidade da nação,
enquanto Monumento Histórico é visto como a reconstituição posterior decorrente
da ideia da necessidade de conservação. É escolhido pelo valor histórico e/ou
artístico, tipologias que seguem inalteradas até o final da Segunda Guerra
Mundial. ( 2011, p. 28).
Para
(FONSECA, 2005, p. 53), em nome do interesse público, o Estado neste século
XVIII assume a proteção legal de determinados bens, simbolicamente capazes de
representar a ideia de Nação.
Assim,
consideramos que o conceito está ligado a sociedade e as condições que ela
encerra, pois a sociedade envolve o que é Patrimônio e o que precisa
resguardar.
Historicamente,
o termo estava mais ligado a objetos mais restritos e relacionados a vida de
todos, como as edificações de Igrejas, de templos, resumindo em vestígios da
antiguidade, edificações religiosas da Idade Média e alguns castelos. O
Monumento era visto como obra criada pelo homem e edificado com o objetivo de
conservar na memória presente e viva para as gerações futuras. (FONSECA, 2005,
p. 54).
Com
o Renascimento, o Monumento tem modificado o seu significado, passando a
incluir toda obra tangível de valor histórico e artístico.
As
noções modernas de Patrimônio ocorrem a partir do momento em que surge a ideia
de estudar e conservar uma edificação pela razão de ser testemunho da história
e/ou obra de arte.
A
partir de 1950, o paradigma sobre Patrimônio é alterado, englobando todas as
formas de edificar e outros tipos de construções, sejam urbanas, rurais,
eruditas, populares e utilitárias, entre outras.
Depois
de 1960, o termo definitivamente se generaliza em substituição a Monumento
histórico e nos finais do século XX se expande mais ainda, possibilitando
englobar bens intangíveis, como práticas, expressões, representações e
saberes-fazer. (CABRAL, 2011 p. 28).
1.2
A perspectiva histórica na construção do Patrimônio
Inicialmente
a noção de patrimônio está ligada a ideia de preservação, tanto envolvendo o
papel da memória e da tradição de se
construir identidades coletivas, como também a utilização pelos Estados
modernos para reforçar a ideia de Nação. (FONSECA, 2005, p.51).
Até
o século XV, desenvolve-se o sentimento de preservação, através de movimentos
isolados dos antiquários, em que os bens são pensados com o caráter artístico
de rememoração.
O
termo é legitimado a partir do final do século XVIII, quando o Estado assume em
nome do interesse público, a proteção legal de determinados bens, capazes de
simbolizarem a nação (2005, p. 51) e valor de conhecimento.
Com
a evolução do conceito, passa-se ter a ideia da posse coletiva do exercício da
cidadania, inspirando então a denominação de Patrimônio, como um conjunto de
bens de valor cultural de propriedade do conjunto de cidadãos, que constituem a
Nação (2005, p.58)
É
neste período que ocorre uma crise do paradigma conceitual até então existente
onde os principais valores atribuídos aos bens patrimoniais eram o valor
histórico e artístico (2005, p.52).
Já
no século XX, o conceito está ligado a bens culturais, sendo que a partir da
segunda metade dele, associa-se a outros tipos de bens, ao uso, tipos de
edificação, tradições e outros.
As
noções modernas começam a ser destacadas
no momento em que se passa estudar e conservar um edifício pela única razão de
ser um testemunho da história e/ ou de uma obra de arte (2005, p. 53)
Este
fato possibilita duas ações: primeiro em relação ao objeto, que para conservar,
não se deve tocar e o outro está ligado a historicidade, onde os valores
histórico e artístico caminham juntos.
1.3
O conceito de Patrimônio do Brasil
No Brasil, o conceito de Patrimônio
tem influência do movimento modernista de 1922 e do governo Vargas, que convidou intelectuais para defender
buscar um identidade coletiva. Representa a criação de uma cultura hegemônica,
propiciando a identificação dos cidadãos com a Nação.
Neste
contexto, no conceito de Patrimônio predomina mais o valor estético do que
histórico. As ideias que são trazidas
com a Semana da Arte Moderna, falam da modernização do Brasil como um todo e de
uma nova linguagem que representasse este movimento moderno. A cidade de Ouro
Preto-MG, por exemplo, e vista como um símbolo da identidade nacional, mais
pelos valores estéticos em detrimento do valor histórico.
Este
período é marcado pela temática da preservação, com a preocupação de salvação dos vestígios do passado da
Nação, quando se deve proteger os
monumentos e objetos, principalmente do século XVIII, que seria uma
manifestação de uma possível civilização brasileira, inclusive com a revalorização
do Barroco local em Ouro Preto.
O Estado, ainda na década de 30, através de Vargas com o
apoio dos intelectuais modernistas, elaboram e incrementam as políticas de
preservação do Patrimônio, dentro de uma agenda de construção da identidade nacional.
Entre as principais ações, destaca-se em 1933 a consagração de Ouro Preto-MG
como monumento nacional e em 1936 a criação do SPHAN – Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional. Em 1937, dá se o tombamento da cidade, levando
em consideração principalmente o valor artístico, olhando os aspectos estéticos
em detrimento da história local.
A partir de 1950, tanto o governo
como a sociedade perdem o interesse sobre o assunto patrimônio em razão de um
pensamento voltado para o desenvolvimento econômico.
Na década de 1960, o assunto volta
a ter importância, agora com a revalorização, sendo considerado instrumento de
integração nacional e turístico.
Já nos anos 70 ocorrem mudanças na
formulação da ideia de Patrimônio, com uma nova concepção de identidade
nacional com o alargamento e inclusão de novos agentes.. Para entender os
critérios que estão por trás, qual valor artístico e histórico, tem-se então um
conceito alargado que abrange um conjunto maior de valores, já que a cidade
agora tem outros valores, como a paisagem, os costumes, as tradições.
O
Patrimônio então não é pensado mais somente com os valores históricos e
artísticos, mas através de outros e com novos objetos, como a arte popular,
ações, atitudes e memórias. Agora como Patrimônio material não se fala mais só
de um lugar, mas diversas ações, edifícios, manifestações
religiosas e populares, incluídas nesta denominação.
1.4 Conclusão
As leituras e debates ocorridos durante os
seminários quando foi estudada a questão do Patrimônio no mundo e no Brasil,
com destaque para a trajetória histórica, dentro do programa da disciplina
História e Estudos Culturais, permitiram compreender a evolução do conceito de
Patrimônio desde sua origem até os dias atuais. Inicialmente com a denominação
de Monumento e sua ligação com a Revolução Francesa, o conjunto de objetos
restritos a edificações e alguns bens principalmente da antiguidade, depois
para reforço das identidades nacionais e afirmação da Nação pelos Estados
Modernos, até chegar aos conceitos mais modernos e ligados ao final do século
XX, quando ocorreu um grande alargamento conceitual, até abranger bens
intangíveis e com outros valores, além do artístico e histórico, considerados
nos primórdios da elaboração conceitual.
CABRAL,
Clara Bertrand. Apontamentos sobre patrimônio e cultura. In: CABRAL,
Clara Bertand. Patrimônio cultural imaterial; convenção da UNESCO e seus
contextos. Lisboa/Portugal: Arte e comunicação, 2011.
CASTRIOTA,
Leonardo Barci. Alternativas contemporâneas para políticas de preservação
in: CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio cultural, conceitos, políticas,
instrumentos. São Paulo: Ana Blume, 2009.
CHOAY,
Françoise. A alegoria do patrimônio. Tradução de Luciano Vieira Machado. – São Paulo: Estação Liberdade:
Editora UNESP, 2001.
FONSECA,
Maria Cecília Londres. A construção do Patrimônio: perspectiva histórica.
In: FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetórias da
política federal de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ/Minc./Iphan,
2005
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