COMO AS MULHERES PARTICIPARAM NAS RELAÇÕES DE PODER QUE RESULTOU NA EMANCIPAÇÃO DE SANTA RITA DO PARANAÍBA
Amélia Augusta, filha da santaritense Francisca Carolina de Nazareth Marques e seu esposo José Xavier de Almeida - presidente de Goiás entre 1901 e 1904RESUMO
Este trabalho pretende mostrar como foi a participação das mulheres nas relações de poder durante os arranjos e embates políticos em Goiás na Primeira República, que resultaram na emancipação de Santa Rita do Paranaíba. Ele será realizado utilizando as categorias Gênero, Mulheres, Política, Experiência e Poder, fundamentadas nos estudos da historiadora norte americana Joan W. Scott, quando pretende-se problematizar a participação das mulheres nestas relações, mostrando a visibilidade e respondendo a questão da ocorrência de uma legitimação do discurso do poder masculino através de práticas nestas relações.
Palavras-chave: Gênero, Mulheres, Política, Experiência e Poder.
INTRODUÇÃO
Embora não sejam invisíveis, pois as mulheres estão nas famílias, nas igrejas, nas escolas e nos palácios, por muito tempo estiveram ausentes das narrativas históricas.
Nos primeiros relatos em que aparecem as mulheres, feitos pelos historiadores gregos e romanos, elas são quase invisíveis no espaço publico, ficam em casa, atuando em família, longe da sociedade, considerando que a invisibilidade representa a ordem perfeita das coisas e a garantia da tranquilidade nas cidades gregas. Nestas primeiras abordagens, só os homens são indivíduos, tem nomes e sobrenomes para serem transmitidos (PERROT, 2007, p. 17).
Crônicas medievais que tratavam dos Santos, mostram as mulheres preservando a virgindade, rezando ou ainda reforçando o discurso de serem piedosas; há também o oposto, como na posição de escandalosas e malvadas para aparecer, entre as quais se destacam os casos das cruéis rainhas Merovíngias.
O reino Merovíngio foi palco das relações de poder entre duas mulheres, quando a Gália foi entrega aos Francos, os reis e seus exércitos martirizavam seus prisioneiros de Guerra, cortando as mãos, os pés e a ponta do nariz, mutilando o resto do corpo com ferro quente. Entre os diversos reinados merovíngios, se destacaram Brunilda e Fredegunda, conhecidas como as mulheres mais sanguinárias da história (CHARRONE, 2010, p. 2)
Escreve João Paulo Charrone, que na segunda metade do século VI, os irmãos Sigiberto e Chilperico eram rivais na região da Gália e travaram vários embates na disputa por territórios, que se tornaram mais cruéis com a morte da esposa de Chilperico, a princesa visigoda Galswinta que era irmã de Brunilda e que apareceu estrangulada no palácio. Este crime colocou as duas mulheres mais cruéis no cenário histórico da época: Brunilda e Fredegunda (2010, p. 2).
Fredegunda, rainha consorte de origem humilde, era serviçal da primeira esposa de Chiperico e convenceu o rei a enviar sua mulher para o convento e então se tornou concubina dele. Prosseguindo sua saga de maldades, conseguiu o assassinato de seu cunhado Sigiberto (2010, p. 2).
Brunilda lutou contra Chilperico a partir do assassinato de Sigilberto, seu esposo, liderando relações de poder, intrigas e conspirações. No final ela caiu nas mãos de Clotário II, filho de Chilperico com Fredegunda e teve morte após a tortura, com seus cabelos atados, braços e pés as caudas de um cavalo, sendo arrastada até morrer no ano de 613 ( 2010, p. 3)
Com a profissionalização da história cientifica nos séculos XVII e XVIII, mostra a inconveniência das mulheres no poder, como Catherine de Medici ou no papel de mãe, dona de casa ou de heroína na França com Joana d’Arc. (PERROT, 2007, p. 18)
Já no século XIX aparecem mulheres aristocráticas que, segundo Michelle Perrot buscam ganhar a vida escrevendo biografias das mulheres: rainhas, santas, cortesãs ou “mulheres excepcionais” (2007, p.18).
Joan W. Scott faz uma reflexão crítica sobre a conexão história das mulheres, política e a própria disciplina história.
Inicialmente cabe destacar os vários sentidos de política correspondentes a diferentes tipos de ação e esferas de atividade:
política” é usada atualmente em vários sentidos. Primeiro, em sua definição mais típica, ela pode significar a atividade dirigida para/ou em governos ou outras autoridades poderosas, atividade essa que envolve um apelo à identidade coletiva, á mobilização de recursos, á avaliação estratégica e á manobra tática. Segundo, a palavra “política” é também utilizada para se referir às relações de poder mais gerais e ás estratégias visadas para mantê- las ou contestá-las. Terceiro, a palavra “política” é aplicada ainda mais amplamente a práticas que reproduzem ou desafiam o que é ás vezes rotulado de “ideologia”, aqueles sistemas de convicção e prática que estabelecem as identidades individuais e coletivas que formam as relações entre indivíduos e coletividade e seu mundo, e que são encaradas como naturais, normativas ou auto-evidentes.” (SCOTT, 2011, p.68-69)
Destaca-se que neste trabalho será utilizado o termo “política” na mesma conotação da historiadora Joan Scott com indistintos limites de definição e espaço, resultando em múltiplas ressonâncias, como deve ser sempre numa narrativa política. (2011, p. 69)
Nas narrativas convencionais da origem do campo História das mulheres e sua conexão com a política, criticada por Joan W. Scott, o ponto de partida se dá nos Estados Unidos após o ano de 1960: “quando as ativistas feministas reivindicavam uma história que estabelece heroínas, prova de atuação das mulheres, e também explicações sobre a opressão e inspiração para a ação.” (2011, p.66).
Depois, entre a segunda metade e o final da década de 70, haveria um afastamento da história das mulheres da política, quando se amplia o campo de questionamento, buscando documentar todos os aspectos da vida das mulheres no passado e ganhando energia própria.
Nesta narrativa linear, o desvio para o Gênero ocorreria na década de 1980 quando este campo conseguiria seu próprio espaço e romperia definitivamente com a política do movimento feminista (2011, p. 66). Nesta narrativa, a história das mulheres passaram do feminismo político, para a história das mulheres, até chegar a teorização através do Gênero. Sairia da política para a história especializada e daí para a Análise ( 2011, p.67).
Esta narrativa linear não é aceita nestes termos por Joan W. Scott, que defende um relato mais complexo, levando em consideração ao mesmo tempo, a posição variável das mulheres na história, o movimento feminista e a disciplina história (SCOTT, 2011, p.67).
Reconhece Scott que a história das mulheres está associada ao surgimento do movimento feminista e que este não desapareceu, tanto da sociedade, quando da universidade e mesmo aqueles que utilizam a categoria gênero se denominam historiadores feministas e grande parte da atual história das mulheres opera com conceitos de Gênero, voltados com preocupação para a política feminista. Defende ela, que os desenvolvimentos da história das mulheres estão relacionados com o feminismo como movimento político. Enfim defende ela, que a história das mulheres é um campo dinâmico na política de produção do conhecimento e está ligado a política feminista e a academia (2011, p. 68).
É dentro desta perspectiva de Gênero e História das Mulheres de Joan Scott, que inserimos a participação das mulheres nas relações de poder, nos embates e arranjos políticos em Goiás no início do século XX. Já que a partir da Política e do Poder, um dos domínios onde o Gênero pode ser utilizado para a análise histórica. (SCOTT, 1990)
Mas por que escrever a história das mulheres em relações já retratadas em que prevaleceram o discurso do coronelismo e do domínio masculino nestes eventos? O diferencial do trabalho resulta neste ponto, pois as mulheres não estavam ausentes destes acontecimentos e propomos responder indagações sobre esta participação delas, com questões, por exemplo, sobre como as mulheres legitimam o discurso do poder masculino ou se já, naquele período, são portadoras de experiências que as tornem emancipadas?
Buscamos outras respostas, tais como: qual seria a base ideológica, como ocorreu o processo de construção e como se dá a experiência e de que maneira estas relações foram moldadas, se num processo de negociação, de imposição ou consensual?
Percebe-se com clareza que as mulheres participaram dos embates e arranjos políticos na primeira República em Goiás, mas faltam trabalhos que mostrem como estabeleceram diálogos com as ideologias: Igreja, escola, imprensa e Família.
Não simplesmente reproduzir tudo que já foi dito, mas problematizar e trazer novos conhecimentos a partir das relações de poder na Primeira República em Goiás é o desafio que propomos.
1 - As mulheres nas relações de poder
Quando se fala da categoria Gênero nos estudos históricos para compreensão da emancipação política de Santa Rita do Paranaíba, adota-se neste trabalho o pensamento de Joan W. Scott, e tem-se como novidade a articulação deste com a noção de poder. No momento em que reconhece que a categoria gênero é um modo de dar significação ás relações de poder e mostrar como a hierarquia de gênero são construídas, legitimadas, contestadas, narradas e mantidas. (SCOTT, 1995, p.12)
Procura-se neste trabalho duvidar das abordagens históricas de dimensão social e política, que atribuíram aos sistema do patriarcado e do coronelismo, a legitimação da liderança masculina nas relações de poder durante a Primeira República em Goiás.
Será articulado o gênero com o poder, levando em consideração a categoria de poder em Foucault, que assim discorre sobre o Poder:
O poder não existe. Quero dizer o seguinte: a idéia de que existe, em um determinado lugar, ou emanando de um determinado ponto, algo que é um poder, me parece baseada em uma análise de enganosa e que, em todo caso, não dá conta de um número considerável de fenômenos. Na realidade, o poder é um feixe de relações mais ou menos organizado, mais ou menos piramidalizado, mais ou menos coordenado. (…) Mas se o poder na realidade é um feixe aberto, mais ou menos coordenado (e sem dúvida mal coordenado) de relações, então o único problema é munir-se de princípios de análise que permitam uma analítica das relações do poder.” (FOUCAULT, 1979, p. 248)
A posição das mulheres nestas relações é de mãe, de filha, de mulher, de primeira dama, de companheira que enfrenta os embates juntos, da administradora dos recursos financeiros, tendo uma participação ativa em alguns campos, mas reforçando o discurso masculino em outros, como o da política, ao não votar, não ocupar cargos públicos e políticos.
Vamos fazer a história das mulheres no espaço público desta cidade de Santa Rita do Paranaíba e de suas relações na política como mulheres que detém o poder.
1.1 - Mulheres e relações de Poder em Santa Rita do Paranaíba
Santa Rita do Paranaíba, até 1909 era um pequeno distrito com cerca de 2000 habitantes, localizado no sul de Goiás e ligado administrativamente ao município de Morrinhos, que servia como principal ponto de ligação do Estado de Goiás com a região sudeste do Brasil através da estrada do sul e da ponte Afonso Pena, também inaugurada em 1909 e que fazia a divisa de Goiás com Minas Gerais, por onde havia intenso comércio e transportes ligando a cidades como Uberlândia e Uberaba, ponto final por onde chegava a linha ferroviária vinda de São Paulo.
Em Santa Rita do Paranaíba, por exemplo, o maior líder local Jacintho Luiz da Silva Brandão tinha ao seu lado a afilhada na Igreja católica e também esposa, Messias Alexandrina Marquez, filha do comerciante Damaso Marquez, irmão de Dona Francisca Carolina Nazareth Marquez de Moraes, uma das mulheres mais ricas de Goiás em 1909.
Em Morrinhos, maior e mais importante cidade do sul de Goiás no início da República tanto em poder econômico, como político, mora Francisca Carolina Nazareth Marquez, que com a morte do Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes, herdou em 1905 uma fortuna superior a 240 mil contos de réis, composta de mais de 28 fazendas, que totalizavam quase 60 mil alqueires, além de poupança, gado e estabelecimentos comerciais.
O casamento do líder santaritense foi realizado em 1900, ele então com 30 anos e ela com pouco mais de 16. Messias, era católica, não teve filhos e não participava das atividades políticas do marido, mas deixou alguns vestígios através de seu sobrinho Damaso lima Maquez, que possa direcionar a ideia que tenha casado por imposição. Certamente, ela aceitou fazer parte do jogo e deve ter encontrado o Coronel local, Jacintho Luiz Brandão nas reuniões políticas em que participavam seu pai Damaso Marquez e seu tio Tibúrcio Marquez, de família tradicionalmente militante na política local. O casamento mereceu destaque na mídia goiana, como se vê no jornal “O GOYAZ”, que publicou uma nota sobre o casamento, realizado em 30 de janeiro de 1900:
Santa Rita do Paranaíba, 30 de Janeiro de 1900
Como admirador da hospitaleira terra Goiana, e dando ostentação ao eu internado reconhecimento, peço-vos dar inserção desta alinhada linha no vosso conceituado, quão criterioso “Goyaz”. Cheio, como se diz, e realmente pomposo, acrescento eu este dia trinta de janeiro neste arraial sempre merecedor das boas graças da situação dominante. É o caso, Sr. Redator, que jamais se apagará da memória dum Santarritense criterioso e agradecido. Todos unicorde, anima uma festejamos o enlace do nosso chefe político o Sr. Jacintho Brandão com a senhorita D. Messia Marquez, predileta filha do nosso amigo, o Sr. Damaso Marquez e a Senhora Dona Filomena Alexandrina da Silveira. Teve lugar o acto civil com todas as formalidades da lei, em casa da residencia do nubente, em seguida, o acto religioso. Não sei o que mais admirar, Sr. Redator, se o escrupulo na observação a Lei do nosso regime Republicano ou no restrito cumprimento ás leis eclesiásticas, já que católicos somos, todos nós. Na ocasião do ato religioso, o Vigário da vizinha freguezia da Abadia do om Sucesso, que para administrar sacramentos nesta freguezia obtivera licença, em palavras repassadas de unção explicando o grande sacramento, saudou c alorosamente aos nubentes. Servio-se em seguida profuso copo de cerveja, levantando-se diversos brindes: do Reverendo Vigário, fazendo interessante paradoxo entre as flores naturais e artificiais que embelezavam a sala de festim e os futruos dias de encantos e harmonia que desejava aos novivos... Em seguda (…) Mais uma vez, Sr. Redator tivemos ocasião de admirar prendados distitivos do nosso chefe. Pois em linguagem limitada e signficativa pediu a todos que o acompanhasse em uma saudação a seus velhos amigos que não puderam atendes a seu conrtive. Terminou se finalmente, Sr. Redator, esta festa realmente de família com as emocionantes expressões doReverendo Vigário, saudando na pessoa do nosso chefe a todos os goianos e na pessoa de sua então dgna consorte o sexo que em todas as esposas se impõe, com uma coroa de virgem, ou com a duplice aurola de esposa e mãe. SIM, Sr. Redator, o dia trinta jamias se apagará de nossa memória, e assim rendemos um pleito alias mereceo ao Coronel Jacinto e a distinta família Marquez.
As relações entre o Arraial de Santa Rita do Parnaíba e Morrinhos foram constituídas desde a metade do século XIX, quando Santa Rita do Paranaíba era um distrito de Morrinhos, condição esta que perdeu durante um período (1855-1859), quando Santa Rita do Paranaíba passa a fazer parte do município de Santa Cruz de Goiás, mas que retornou após emancipação de Morrinho, ficando Santa Rita do Paranaíba como distrito de Morrinhos de 1870 a 1909.
As ligações entre o distrito e o município de Morrinhos estavam também relacionadas com as famílias, fato que mantinha a dominação, já que Francisca Carolina de Nazareth Marquez de Moraes casou-se m 1869 com Hermenegildo Lopes de Moraes e mudou-se para Morrinhos em 1870. Francisca Carolina era tia de Messias Alexandrina e mantinha o poder no distrito através de Jacintho Luiz da Silva Brandao, seu esposo. Por causa desta relação, é provável que Santa Rita do Paranaíba não se emancipasse. Não era interesse de Jacintho Luiz da Silva Brandão e do Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes, enquanto em vida, e após a sua morte em 1905, quando seu filho que tinha o mesmo nome do pai por volta de 1909 com o comando político na região, tornar independente o distrito de Santa Rita do Paranaíba (FERREIRA, 2009).
Desde a segunda metade do século XIX, já se percebe vestígios das relações de Francisca de Nazareth Marquez de Moraes com seu futuro marido Hermenegildo Lopes de Moraes, na época com cerca de 20 anos de idade e casada com o primeiro marido Alcebíades José da Silveira ,conforme constam nos registros batismais da Paróquia de Santa Rita de Cássia, ocasião de um reconhecimento de paternidade:
(…) a quatro de outubro de 1863, o vigário Félix Fleury Alves de Amorim Baptizou e poz os santos óleos ao innocente Alexandre Filho de Anna Rosa Ribeiro, solteira, foram padrinhos Alcebíades José da Silveira e sua mulher D. Francisca Carolina de Nazareth. No acto de f azer-se o presente assentamento apresentaram-se-me Manoel Silveira, Alcebíades Jose da Silveira, sua Mulher D. Francisca Carolina Ferreira, Joaquim Martins Marquez, e Hermenegildo Lopes de Moraes abaixo assignados perante quaes José Manoel da Silveira declarou- me que reconhece por seo legítimo filho o innocente Alexandre, filho de Anna Roza e pediu-me que fizesse a presente declaração que vae assignada por mim Padre Félix Fleury de Amorim Vigário collado desta Freguesia de Santa Rita do Paranahyba por se achar parallytico das mãos José Manoel da Silveira assigna por seu mandato o seo filho Alcebíades Jose da Silveira, os padrinhos, e as testemunhas acima delcaradas.
(FERREIRA, 2009, p. 218).
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O Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes era comerciante, fazendeiro e administrador do Porto de Santa Rita do Paranaíba, num momento em que estava ocorrendo a Guerra do Paraguai (1864-1870), em que as tropas necessitavam de gêneros alimentícios, ocasião em que ele aproveitou e tornou-se um grande fornecedor. Até percebe-se pelos relatos, um certo conflito de interesses, já que era funcionário público como administrador do Porto e que podia usar os recursos do Estado para pagar a compra dos mantimentos; por outro lado, como comerciante era um grande fornecedor destas tropas.
Com a morte de Alcebíades José da Silveira, primeiro esposo de Dona Francisca Carolina de Nazareth Marquez, a viúva então com 26 anos, casa-se com o Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes no dia 04 de novembro de 1869, conforme registros de casamentos da Paróquia de Santa Rita de Cássia:
(…) novembro de 1869. Aos quatro dias do mês de novembro de mil oitocentos e sessenta e nove nesta Parochia de Santa Rita do Paranahyba, da Provícia e Bispado de Goiaz pelas quatro horas da tarde em minha presença compareceram os nubentes Hermenegildo Lopes de Moraes e D. Francisca Carolina de Nazareth, habilitados com as trez admoestações que ordena o sagrado concilio Tridentino, e a Constituição Metropolina, e com os demais papéis de estylo, e sem impedimento algum canônico, ou civil para o cazamento: elle de idade trinta e seis anos, solteiro natural e baptizado na Freguezia de N..S. Da Abadia do Curralinho, filho legitimo de André Corcino de Moraes, e de Maria das Virgens da Conceição: ella de idade vinte e seis annos, viúva por falecimento de Alcebíades José da Silveira, nascida nesta Freguezia e Baptizada na Freguezia de S. Francisco de Monte Alegre, filha legiítima de Manoel Martins Marquez, e da fallecida D. Hyppolita Maria de Nazareth, todos naturaes deste bispado e moradores nesta Parochia de Santa Rita do Paranahyba os quaes os nubentes se receberão por marido e mulher com palavras de presente conforme os votos cerimoniais da Santa madre Igreja Cathólica Apostólica Apostólica Romana, sendo testemunhas presentes o Tenente José Fleury Alves D´Amorim,sua consorte D. Anna de Siqueira Fleury, e Carlos Martins Marquez, moradores nesta Freguezia, que sei serem os próprios; do que tudo para constar lavrei este assento que depois de lido, e conferido perante as testemunhas, commgio a assignaram. (FERREIRA, 2009, p. 219)
No primeiro casamento, Dona Francisca Carolina Marques teve 3 filhos com Alcebíades José da Silveira e após ter o primeiro filho no segundo casamento em 1870 com o Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes, mudou-se para a cidade de Morrinhos, que estavam se emancipando.
1.2 - As mulheres e relações de poder em Morrinhos
Em Morrinhos no início do século XX, maior e mais importante cidade do sul de Goiás no início da República tanto em poder econômico, como político, mora Francisca Carolina Nazareth Marquez, que com a morte do Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes, herdou em 1905 uma fortuna superior a 240 mil contos de réis, composta de mais de 28 fazendas, que totalizavam quase 60 mil alqueires, além de poupança, gado e estabelecimentos comerciais.
No auge dos movimentos que vão mudar a política em Goiás em 1909, a partir de Morrinhos, centro do poder político em Goiás na ocasião, quando da emancipação de Santa Rita do Paranaíba, aparece a figura de Francisca Carolina Nazareth Marquez de Moraes, administrando uma grande fortuna, herdada do Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes(OLIVEIRA, 2006).
A filha de Francisca Carolina de Nazareth Marques de Moraes com o Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes, Amélia Augusta, estava casada com o líder político em Goiás desde 1901, José Xavier de Almeida. Na capital do Estado de Goiás, se tornou primeira dama mais jovem do Estado em 1901, então com 17 anos, quando acompanhou o marido na chegada ao Palácio do governo em Agosto de 1901 e de sua saída do poder em 1909 com o movimento promovido pelos Bulhões (BRITO, 1974).
O primeiro filho de Francisca Carolina de Nazareth Marquez de Moraes com o Coronel Hermenegildo Lopes de Moraes, nascido em 1870 em Santa Rita do Paranaíba tinha sido eleito presidente do Estado, mas não veio a assumir, devido ao Movimento de 1909 em Goiás, articulado pelo Grupo político dos Bulhões (BRITO, 1974).
Nos embates e arranjos políticos, que resultaram no Movimento de 1909 em Goiás e na emancipação de Santa Rita do Paranaíba, há uma série de relacionamentos que liga o município de Morrinhos a capital de Goiás, como se nota nas pessoas das lideranças políticas e suas esposas, como na capital com José Xavier de Almeida e Amelia Augusta, José Leopoldo de Bulhões Jardim e Cecília Adelaide, passando por Morrinhos com Hermenegildo Lopes de Moraes e Francisca Candida de Nazareth Marques Moraes, até chegar em Santa Rita do Paranaíba com Jacintho Luiz da Silva Brandão e sua esposa Messias Alexandrina.
1.3 - As mulheres e as relações de Poder na Família Bulhões
Cecília Adelaide Félix de Souza, nascida em 1873, casou-se no dia 12 de outubro de 1890 com O líder vencedor do movimento de 1909, José Leopoldo de Bulhões Jardim, conforme relata o jornal GOYAZ:
Realizou-se no dia 12, ao meio dia, em casa do falecido Major Ignácio de Bulhões, o casamento do nosso chefe político Dr. Leopoldo de Bulhões com a Exma. Sra. D. Cecília Adelaide Felix de Sousa. Foram padrinhos os Srs. Francisco Leopoldo Rodrigues Jardim e Dr. Urbano Coelho de Gouvea. Presidindo o acto o jiz dos casamentos Dr. Ramiro Pereira de Abreu. (…) a noite a banda de música Alliança Goyana veio cumprimentar o Dr. Bulhões, mas achado-se ainda de luto o felicitado, os distintos artistas o brindaram e retiraram-se. Terminou (...)
GOYAZ, 17/10/1890 – Edição 265
É interessante também mostrar o lugar nestas relações de poder, que mostra uma família que não recebe influência da Igreja Católica, já que José Leopoldo de Bulhões Jardim, tinha formação liberal e contrária a hegemonia da Igreja Católica na região, gerando grandes conflitos, que inclusive ocasionou a mudança da sede do episcopado da capital goiana para Uberaba, em Minas Gerais, devido a desentendimentos com o Bispo Dom Eduardo Duarte da Silva.
Pelos vestígios vão ocorrer casamentos realizados apenas pelo ato civil, como o de Adelaide Emília de Bulhões Jardim, nascida em 1850, irmã e sogra de José Leopoldo de Bulhões Jardim, que se casou com o irmão de seu pai, Benedicto Felix de Sousa.
Nos primeiros anos da Primeira República foi aprovado o Decreto 181 de 24/01/1890 considerando somente válido para os efeitos legais o casamento realizado no civil, desencadeando uma série de conflitos entre o político José Leopoldo Bulhões com a Igreja Católica, que resultou inclusive na mudança da sede da diocese da capital goiana para Uberaba em Minas Gerais em 1896. Neste período o clero fez intensa campanha para se evitar o casamento civil e defendia a necessidade da “moralização da vida privada” através do casamento no religioso (SILVA, 2003).
Exatamente neste ano que José Leopoldo Bulhões Jardim se casa e confirmando sua posição liberal e Republica, seu casamento é realizado somente como ato civil, enquanto que a maioria das famílias em Goiás ainda faziam questão de realizar as cerimônias religiosas como pregava e defendia a Igreja Católica (SILVA, 2003).
O jornal GOYAZ de propriedade da família Bulhões na sua edição nº 250 de 04 de julho de 1990 traz informações sobre a validade somente do casamento civil, informando que desde 24 de maio de 1890, somente ele é válido, ressaltando que eram permitidas as formalidades e cerimônias religiosas, mas que não produziam nenhum efeito legal, como o estabelecimento do vínculo conjugal, sobre direitos e deveres dos cônjuges, pátrio poder, legitimidade da prole, parentesco legítimo e direitos sucessórios. (GOYAZ, 1890)
José Leopoldo de Bulhões Jardim também faz sua ligação entre a capital e o distrito de Santa Rita do Paranaíba, através de sua irmã Ângela de Bulhões Jardim, casada com o ex ministro do STF (1905) e Procurador Geral da República Guimarães Natal.
Joaquim Xavier Guimarães Natal era irmão do administrador da recebedoria de Santa Rita do Paranaíba, Antônio Xavier Guimarães, e que foi um dos líderes a partir de sua fazenda no norte, do movimento de 1909, que resultaria na emancipação de Santa Rita do Paranaíba e no reconhecimento daquele que tinha perdido a eleição como presidente do Estado de Goiás, o Engenheiro e militar Urbano Coelho de Gouvêa, casado com Leonor Adelaide Bulhões Jardim, também irmã de José Leopoldo de Bulhões Jardim (CAMPOS, 1996).
Católicos, engenheiros, militares, advogados e funcionários públicos, mães, filhos/as, irmãos/ãs, cunhados/as, um circulo de relações que muda a história de Goiás, num tempo em que se atribuiu todas as mudanças aos coronéis, excluindo as mulheres das relações de poder, quando se ainda escrevia uma história em que as mulheres estavam ausentes do discurso oficial.
A Expansão dos estudos sobre as mulheres levou a uma redefinição do político, antes ligado ao campo do poder das instituições públicas e do Estado, passando para a esfera privada e do cotidiano (MATOS, 2002 p.1050). Assim, é possível encontrar nas “brechas” ocupadas por estas mulheres goianas na Primeira República que levaram elas a ocupar o espaço publico como parceiras dos homens nas viagens, nos encontros festivos nos palácios e enfim nas relações do poder (MATOS, 2002, p. 1050).
Antes, os limites entre o público e o privado estavam bem delimitados, com o privado sendo considerado o espaço das mulheres, o locus da moralização, ocupando com a definição das esferas sexuais e da delimitação do espaço entre os sexos, a representação do lar, da família, destacando a maternidade como necessidade (MATOS, 2002, p. 1055).
Mudar a narrativa histórica através de representações que mostrem as mulheres goianas ativas e parceiras nas relações de poder, e que apesar de não conseguirem visibilidade nas tramas das eleições e nos Partidos políticos, ganham voz e visibilidade com a participação nos embates e arranjos políticos do início do século XX em Goiás, pela historicidade da vida íntima, dos lugares da vida doméstica como mães, filhas, esposas.
Pretende-se construir uma abordagem histórica considerando os espaços em que as mulheres ganham visibilidade, a partir de experiências em que o sujeito é constituído, como nas Igrejas, na família, nos eventos festivos, nas viagens, pois conforme ressalta Maria Izilda Matos, acontece a politização dos espaços privados com a política chegando ao âmbito do cotidiano, permitindo questionar várias transformação na sociedade, como o funcionamento da família, as mulheres, as lutas e os gestos do cotidiano (MATOS, 2002, p. 1048).
Como pesquisador, surgem novos desafios com esta politização do privado e privatização do público, pressupondo uma comunicação com os testemunhos (MATOS, 2002, p. 1058).
Enfim, vamos seguir o conselho de Joan W. Scott que propõe historicizar a experiência (SCOTT, 1999 p. 41). Isto é, construir as abordagens históricas considerando os espaços em que os sujeitos se constituem e a partir das experiências possíveis nos lugares e tempos em que estas acontecem. Fazendo uma análise dos modos de vida, das relações pessoais, das redes familiares, das amizades tanto entre homens e mulheres, como entre as próprias mulheres, os vínculos afetivos, as formas de comunicação, de resistência e de lutas neste período de embates e arranjos políticos em Goiás.
2 - A experiência
A abordagem que se propõe quando da pesquisa de relações de poder que resultaram na emancipação de Santa Rita do Paranaíba leva em consideração o tratamento proposto por Joan W. Scott em relação as categorias de análise histórica, que devem ser vistas como contextuais, contestáveis e contingentes, em especial a categoria experiência (SCOTT, 1999, p. 46).
Experiências que constituem os sujeitos, e que sejam tomadas como ponto de partida para a desconstrução da história social, do discurso, da linguagem e de todas outras formas que excluíram as mulheres como participantes dos embates e arranjos políticos de Goiás.
As mulheres estavam presentes nas relações de poder que resultaram na emancipação de Santa Rita do Paranaíba, e com a utilização da categoria Experiência proposta por Joan W. Scott, é possível dar visibilidade a estas pessoas:
(…) Não são os indivíduos que têm experiência, mas os sujeitos é que são
constituídos através da experiência. A experiência, de acordo com essa definição, torna-se, não a origem de nossa explicação, não a evidência autorizada (porque vista ou sentida) que fundamenta o conhecimento, mas sim aquilo que buscamos explicar, aquilo sobre o qual se produz conhecimento. Pensar a experiência dessa forma é historicizá-la, assim como as identidades que ela produz. Esse tipo de historicização representa uma resposta aos/às muitos/as historiadores/as contemporâneos/as que argumentam que uma “experiência” sem problematização é o fundamento de suas práticas; é uma historicização que implica uma análise crítica de todas as categorias explicativas que normalmente não são questionadas, incluindo a categoria “experiência” ( SCOTT, 1999, p. 27-28).
Pretende-se buscar vestígios de experiências na documentação escrita sobre os homens e as mulheres, a economia, os costumes, a sociedade, enfim nas diversas experiências para entender como foram articuladas e construídas estas diversas relações de poder. Buscar respostas sobre o que estava por trás das relações de casamento, dos pactos matrimoniais a composição de poder que legitimou uma prática de pacto coronelista em Goiás no início do séc. XX e produzir novas narrativas sobre este período de embates políticos em Goiás usando as experiências como ponto de partida.
A novidade e originalidade de sua proposta é justamente perceber nestes pactos a presença das mulheres uma possibilidade de atuarem como protagonistas neste momento politico.
A categoria experiência tendo Scott como fundamento vai além da constatação das diversas ações das mulheres nas relações de poder na Primeira República em Goias como já descritos pelos historiadores ortodoxos que utilizaram como evidência incontestável do domínio dos homens, mas parte para produzir conhecimento a partir da reflexão sobre a maneira como as mulheres viveram e interpretaram sua existência nestas relações de poder como mães, filhas, esposas, primeiras damas, herdeiras das fortunas, sempre ativa em todos os embates e arranjos que se deram em Goiás nos primeiros 10 anos do século XX.
Para Scott, a experiência não é apenas aquela que legitima a autoridade de uma narrativa, muito mais que isto ela pode gestar os sujeitos históricos:
Quando a experiência é considerada como a origem do conhecimento, a visão do sujeito individual (a pessoa que teve a experiência ou o/a historiador/a que a relata) torna-se o alicerce da evidência sobre o qual se ergue a explicação. Questões acerca da natureza construída da experiência, acerca de como os sujeitos são, desde o início, constituídos de maneiras diferentes, acerca de como a visão de um sujeito é estruturada - acerca da linguagem (ou discurso) e história – são postas de lado. A evidência da experiência, então, torna-se evidência do fato da diferença, ao invés de uma maneira de explorar como se estabelece a diferença, como ela opera, como e de que forma ela constitui sujeitos que veem e agem no mundo ( SCOTT, 1999, p. 26).
As experiências das mulheres quando destes embates e arranjos não podem ser consideradas um momento de emancipação dessas mulheres, e embora elas tenham participado ao lado dos homens de muitos eventos, acabaram legitimando o discurso masculino.
A experiência neste contexto é uma história do sujeito e também um evento linguístico, pois, não acontece fora de significados estabelecidos. A explicação histórica não pode separar as duas, mas também não está presa a uma ordem de significados. A experiência é uma história do sujeito e a linguagem é o local onde a história é encenada (SCOTT, 1999, p. 42). Por isso a sua busca em historicizar a experiência destas mulheres em seus lugares estabelecidos para reconhecer os seus lugares de sujeito nestas articulações políticas em Santa Rita do Paranaíba.
Com quem as mulheres dialogam nestas relações de poder?. Com os padres, os pais, os filhos, a imprensa, os políticos, os professores, os amigos, os parentes. Há um movimento, uma lógica. Elas não são obrigadas a entrarem nessas relações de poder, fazem isso com liberdade e se articulam, embora não consigam a emancipar-se, enquanto sujeitos historicamente engajadas, participam como parceiras, mas fortalecendo o discurso do poder masculino. Então, sabendo disso, você vai se refletir sobre estas experiências fazendo questionamentos como em que evidenciam este movimento dessas mulheres, as brechas no poder em que se constituem sujeitos? Se são instáveis?
Como estas relações foram sendo moldadas de maneira negocial nos encontros políticos, nas visitas, nas reuniões festivas e que culminam no casamento. Embora houvesse o desejo dos pais, dos líderes políticos, as mulheres tinham condições de dizer não, como fizeram algumas que preferiram ficar solteiras e não participaram das relações de poder, mas as que assim decidiram, foram porque aceitaram as condições do jogo do poder.
As mulheres estavam presentes nos eventos festivos dos palácio, nos eventos públicos e nas viagens entre a capital, Morrinhos e Rio de Janeiro. Mas era no em sua residência que confidenciava com seu parceiro o seu dia a dia, como bem enfoca Célia Coutinho Seixo de Brito (BRITO, 1974).
Como estas relações de gêneros foram moldando-se e como foram se naturalizando? sendo aceitas estas negociações de maneira consensual, levando as mulheres das relações de poder a ganhar já que poderiam participar bem de perto dos embates e arranjos políticos que mexeram com as estruturas do poder em Goiás e em Santa Rita do Paranaíba em 1909.
3 - A base ideológica
A Ideologia neste trabalho é vista como um sistema de convicção e prática que estabelece as identidades individuais e coletivas, que formam as relações entre os indivíduos, coletividades e seu mundo, e que são encaradas como naturais, normativas e auto evidentes. (SCOOT, 2011, p. 69)
A família, a Igreja, a escola e a imprensa são alguns aparelhos de tecnologia do Gênero ( LAURETIS, 1994), que trabalharam na construção do discurso em que o masculino prevaleceu nos embates e arranjos políticos de Goiás naquele período. Os vestígios mostram que as mulheres aceitaram participar das relações de poder sem interpelação, mas sem uma posição de subordinação, onde o poder foi a força motivadora de suas participações.
Como foi engendrado este discurso em que o masculino prevaleceu tem resposta nos discursos políticos, onde só o masculino está presente, nas praticas, e nas escolas, que reservam aos homens, por exemplo, estudar direito em São Paulo e as mulheres fazerem até o curso normal e encerrarem ai o seu ciclo de estudo, mesmo morando em grandes centros, como no Rio de Janeiro.
Ideologicamente parte destas mulheres estão ligadas a Igreja Católica, que neste momento trava uma batalha contra o casamento civil, instituído com a proclamação da República. Toda mulher católica, além do ato civil, deve também casar no religioso que, segundo o clero, era o sacramento abençoado por Deus e efetivamente constituía-se na verdadeira união.
Por que elas estão neste lugar, como mães, filhas, esposas, administradoras, primeiras damas? O Gênero define o lugar do indivíduo na relação e as instituições: Igreja, Escola, Imprensa e família criaram um discurso sexualizado, fabricando o gênero. Destacamos algumas práticas destas tecnologias de Gêneros, que influenciaram na vida diária das mulheres naquele período:
3.1 - A Igreja Católica
A atuação do Clero foi intensa no período estudado, tentando normalizar os comportamento das pessoas por meio do casamento, como mostra o estudo de Maria da Conceição Silva, realizado em Goiás no período de 1860 a 1920:
(…) analisa a atuação do clero no sentido de normalizar o comportamento das pessoas por meio da celebração do matrimônio na cidade de Goiás, no período de 1860 a 1920, sendo que as normas católicas tinham por objetivo implantar um catolicismo ultramontano tridentino. Assim, o clero ultramontano procurava moralizar a vida privada do fiel e também evitar a adesão deste ao casamento civil, sobretudo após a aprovação do Decreto n. 181, de 24 de janeiro de 1890, que o estabeleceu no País (SILVA, 2003).
Há um embate entre as ideias liberais dos jovens que estudaram ciências políticas e direito em faculdades de São Paulo, que buscavam a liberdade de culto, registros e casamentos civil e o clero que tentava manter o casamento religioso com o mesmo status de antes da proclamação da República, que separou a Igreja do Estado. (SILVA, 2003)
3.2 - A Imprensa
Como defende (AGE, 2010), a imprensa reflete e reforça os padrões comportamentais estabelecidos socialmente em uma determinada época. Através de jornais goianos do período, como “O GOYAZ”, é possível perceber as imagens da mulheres goiano no início da República.
3.3 - A Escola
As escolas de direito de ensino superior está reservada ao homens. Os grandes fazendeiro enviam seus filhos para fazer o curso superior em São Paulo e retornar para ocupar espaço na política federal como deputados e senadores.
Para as mulheres, o máximo que conseguem e fazer o ensino normal em escolas católicas.
3.4 - A Família
Os pais estão separados em dois grupos, sendo um composto por intelectuais não católicos, que ocupam cargos no governo federal e fizeram curso superior nas escolas de direito, destacando o líder José Leopoldo de Bulhões Jardim, que induz o casamento civil endogâmico; por outro lado estão os coronéis fazendeiros, católicos, que constituíram riquezas desde o tempo do império e tem em Hermenegildo Lopes de Moraes, o referencial, que com a morte deixa a riqueza para administração de sua esposa Francisca Cândida de Nazareth Marquez de Moraes, que também forma seus filhos homens nas escolas superiores e prepara as filhas mulheres para o casamento civil e religioso.
Conclusão
Este trabalho procurou proporcionar evidência das mulheres nas relações de poder em Goiás, assim como interpretações das várias ações e experiências que possibilitaram a estas mulheres um protagonismo que as distinguiram, enquanto partícipes dos lugares e práticas de poder em que estabeleceram estas relações.
A definição adotada para Gênero, é a de SCOTT, que o define como elemento constitutivo das relações sociais, baseadas em diferenças percebidas entre os sexos e como sendo um modo básico de significar relações de poder. Ao dar significação a estas relações de poder, aponta para mostrar como as hierarquias de Gênero são construídas, legitimadas, contestadas, narradas e mantidas (SCOTT, 1995, p.12).
Em relação a Política, foi trabalhado a narrativa das mulheres a partir de múltiplas ressonâncias, tanto daquela que considera como atividade de governo, que assume esta identidade coletiva a partir da mobilização de recursos, avaliações estratégicas e manobras táticas, como aquela que a define como relações de poder mais gerais e as estratégicas para mantê-la ou contestá-la e finalmente como práticas que reproduzem ou desafiam o que na maioria das vezes, possa ser rotulado como “Ideologias”, que são sistemas de convicções e práticas que restabelecem identidades individuais e coletivas, que formam as relações entres indivíduos e coletividade e seu mundo, encaradas como naturais, normativas e auto-evidentes ( SCOTT, 2011, p. 68-69).
Concluímos que as mulheres não se emancipam em suas relações de poder em Goias no início da Primeira Republica, mas participam de um jogo de maneira consciente que legitimam o discurso masculino em relação a política.
REFERÊNCIAS
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