Monumento a Cunha Mattos - Avenida Beira Rio - Itumbiara
O jornalista Moisés Santana, que
morava em Santa Rita do Paranaíba entre 1918 e 1920, atribuiu a fundação de
Itumbiara ao Marechal Raimundo José da Cunha Matos, que teria aprovado projeto
para construção de uma estrada entre Uberaba – Minas Gerais e Anicuns – Goiás,
passando pelo Sertão da Farinha Podre, abaixo da foz do Rio das Velhas.
O IBGE reproduziu a informação na Enciclopédia
dos municípios brasileiros e assim por 105 anos e desde 1919 tem sido
considerado.
Em pesquisa realizada no ano de 2009,
quando do centenário do aniversário de emancipação de Itumbiara, os
historiadores Antônio César Caldas Pinheiro e Josmar Divino Ferreira, após
ampla pesquisa, publicaram o livro “Santa Rita do Paranahyba: origem e
desenvolvimento. História de Itumbiara- 1909”, que leva a conclusão de que não
ocorreu tal fundação em 1824 e que a autoria da construção da Estrada de
Uberaba para Anicuns, passando pelo Sertão da Farinha Podre, também não é
comprovada. Para fundamentar as conclusões, os autores utilizaram as obras do
próprio Marechal Cunha Mattos que registrou sua passagem pela província de Goiás
entre 1823 e 1826.
A
atribuição de fundador, que foi assumida pelo IBGE em sua Enciclopédia,
teria como origem um informação do jornalista Moisés Santana em 1919 na Revista
Paranaíba, atribuindo a Cunha Matos o papel de fundador de Santa Rita do
Paranaíba. Em 200 anos, após a data de 1824, sugerida como fundação, nenhum
documento foi encontrado que confirme a fundação, mas que segue como verdadeira
pelo município de Itumbiara. A data não é celebrada, pois se comemora o aniversário somente 12
de outubro de 1909, dia instalação, definida por Decreto Estadual em setembro de 1909.
Mas quem foi Cunha Mattos e o que fez
entre 1817 e 1839, no período em que ficou no Brasil?
Em
biografia resumida, Raimundo José da Cunha Matos, nasceu em Faro – Portugal em
2 de novembro de 1776 e faleceu no Rio
de Janeiro, 1839. foi um militar e historiador luso-brasileiro. Entre suas
obras, que ajudam a entender sua passagem por Goiás, está “Itinerário do Rio de
Janeiro ao Pará e Maranhão pelas provincias de Minas Gerais e Goias – 1823-1826
(publicado em 1836). Filho de Alexandre Manuel da Cunha Matos e Isabel Teodora
Cecília de Oliveira Fontes, casou-se com sua prima Maria Venância de Fontes
Pereira de Melo. Sentou praça em 1790, no regimento de artilharia do Algarve,
em que seu pai era furriel. Combateu na Catalunha e Roussillon. Passou para a
marinha em 1796, onde continuou seus estudos de artilharia. Em 1797 foi nomeado
comandante da guarnição de São Sebastião, na Ilha de São Tomé, onde foi
ajudante de ordens do governador, provedor da fazenda e feitor da alfândega. Em
1814, major, foi, em licença, ao Rio de Janeiro, onde foi nomeado
tenente-coronel, retornando as ilhas como governador. Retornou ao Rio, onde
depois deslocado à Pernambuco, combateu a Revolução Pernambucana, em 1817. Em
1818 foi encarregado de organizar a 1a brigada miliciana, pelo general Luís do
Rego, assim como a organização das baterias de defesa da costa. Retornou ao
Rio, onde em 1819 foi nomeado vice-inspetor do arsenal. Em 1823 foi nomeado
comandante de armas de Goiás, donde regressou em 1826 como deputado e foi
promovido a brigadeiro. Passou pelo Rio Grande do Sul, como recrutador, nomeado
pelo Marquês de Barbacena. Inspetor do arsenal do Exército em 1831, foi a
Europa de licença, onde no Porto foi testemunha do Cerco do Porto, a respeito
do qual escreveu um livro que editou no Brasil, episódio da Guerra Civil
Portuguesa. Retornou ao Brasil, antes do final do cerco, em 1833, para assumir
o cargo de diretor da Academia Militar. Propôs, em 1838, junto com o cônego
Januário da Cunha Barbosa a fundação do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, numa assembléia composta por vinte e sete membros fundadores. Foi
agraciado oficial da Imperial Ordem do Cruzeiro e comendador da Imperial Ordem
de Avis.
O que era o cargo de Governador das
Armas – exercido por Cunha Mattos entre 1823 e 1825 na província de Goiás?
Cargo criado por meio do decreto de 1º de outubro de
1821, após a Revolução do Porto, pelas Cortes portuguesas, a fim de melhor
administrar e controlar a Colônia. Cada província deveria ter um governador das armas,
submetido às ordens do reino e independente das Juntas
provisórias. As juntas eram eleitas na localidade e exerciam
o Poder Executivo com todas as suas atribuições, exceto a autoridade militar,
da qual ficou encarregado o governador das armas, cargo subordinado diretamente
a Portugal. Normalmente, o cargo era ocupado por generais que deveriam
controlar e organizar as tropas, aplicar a justiça militar, bem como executar
quaisquer outras atividades de âmbito militar. Estavam impedidos, porém, de
interferir em outros assuntos da província e até mesmo nas eleições de soldados
por ordenança. A função foi substituída pelo título comandante das armas em
1830, e no ano seguinte, extinta dos cargos militares. (Glossário de
História Luso-Brasileira)
Referências bibliográficas
RODRIGUES, Neuma Brilhante Rodrigues. Nos caminhos do Império: a trajetória de Raimundo José da Cunha Mattos. Tese
de Doutorado. Brasília – julho 2008 – Universidade de Brasília - Instituto
de Ciências Humanas
– Departamento de História.
FERREIRA, Josmar Divino; PINHEIRO, Antônio César Caldas. Santa Rita do Paranahyba: origem e desenvolvimento. História de Itumbiara. v. 1 – Itumbiara, Edição Independente, 2009.
QUEIRÓS,
Bianca Martins. Raimundo José da Cunha Matos (1776-1839) A pena e a espada a
serviço da pátria. UFJF – 2009
Nilson
Freire em sua obra “Nas Barrancas de Santa Rita do Paranaíba” – assim descreve
a passagem de Cunha Mattos pela província de Goyás entre 1823 e 1826:
A PASSAGEM DE CUNHA MATTOS PELA PROVÍNCIA DE GOYAZ
A Doutoranda em História, Neuma Brilhante Rodrigues19, fez um
estudo sobre a passagem de Cunha Mattos
por Goiás no período imperial. Segundo ela, o Marechal serviu como governador de armas na Província entre os meados
de 1823 e início de 1826. Ele teria saído do Rio de Janeiro numa viagem por cerca de 2 meses chegando à cidade de Goiás em 15 de julho de 1823.
Na época, a Província de Goyaz contava
com um governo civil composto
por uma junta provisória com
5 a 7 membros eleitos entre os cidadãos mais célebres por conhecimento, probidade e fidelidade à causa constitucional. O Poder militar
era exercido pelo Marechal
das Armas.
Segundo Rodrigues, o modelo de Poder imposto pela Corte
enfraquecia os Poderes das Províncias. É nesse cenário
que Cunha Mattos
toma posse como governa dor das armas no dia seguinte à sua
chegada, tendo como local o Palácio Conde dos
Arcos. O ato foi oficializado pelo presidente da Junta, Álvaro
José Xavier Guimarães.
Em 23 de junho de 1823, o Marechal Raimundo José da Cunha
Mattos escrevia à Secretaria de Negócios da Guerra, manifestando sua disposição para ajudar a Junta Provisória, destacando entre
outras coisas: examinar minas, consertar, cobrir novas estradas, reparos
de pontes e braços de rios, entre
outros.
O período em que o Marechal de Armas esteve
na Província foi marcado por intensos atritos
com o governo civil, inicialmente com a Junta, que considerava o marechal arrogante, soberbo e prepotente, e depois com o
primeiro presidente da Província.
Cunha Mattos esteve
na região Sul da província de Goiás (sem qualquer
referência sobre a sugestão da estrada Uberaba – Anicuns), em agosto
de 1823, pois relata Rodrigues que, em 25 de agosto
de 1823, Cunha Mattos encontrava-se numa viagem
pelo sul da Província. Ele estaria desde o início
do mês inspecionando as condições das tropas, quando foi avisado pela Junta provisória que o norte da Província, hoje
estado do Tocantins, corria risco de ser invadido pelas tropas portuguesas do
Maranhão, o que obrigou o governador das armas a retornar e seguir
para combater.
Diante desse fato, em 19 de setembro, Cunha
Mattos reuniu o Conselho
de Guerra, composto por Sargentos-mores, Capitães e oficiais
subalternos da tropa de linha e partiu
no dia 20 de setembro para uma viagem de mais de 300 léguas rumo ao norte, ficando por aqueles lados
por quase um ano. Os invasores portugueses foram vencidos antes
da chegada de sua tropa,
fato do qual se aproveitou para escrever o itinerário de sua viagem.
As desavenças entre os governos civil e militar na
Província se acentuaram, quando
chegou em Goyaz, em fevereiro de 1824, a Lei de 20 de outubro de 1823, aprovada pela Assembleia Constituinte, dando
nova organização à administração da Província
. Pelo novo modelo, cada uma seria administrada por um presidente, com características de executor e
administrador, auxiliado por um conselho provincial eletivo.
Embora conservasse a separação dos governos civil e
militar, diminuiu bastante a
autonomia do comandante militar em relação ao presidente da Província. Cunha Mattos tomou conhecimento desta Lei
em 09 de fevereiro de 1824, quando estava na Villa de Cavalcante (Tocantins).
Assim, em setembro de 1824, a Junta Provisória foi substituída pelo presidente da Província, Caetano Maria Lopes Gama e em fevereiro de 1825, Cunha Mattos foi eleito deputado da Assembleia Geral
Legislativa do Império do Brasil, e novamente
escreve ao Ministro de Negócios da Guerra deixando a Província de Goyaz
em 03 de maio de 1825, substituído
por Luiz da Costa Freire de Freitas. Nota-se que contava com muito prestígio e influência junto ao Conselho
Militar e ao Imperador.
Posteriormente, Cunha Mattos
volta à Goyaz em maio de 1826, com a patente de Brigadeiro efetivo do Exército Brasileiro e Oficial da Ordem do Cruzeiro. Ainda
foi reeleito deputado da Província no período de 1830 a 1833, sendo que licenciou-se para ir a Portugal
de 1831 e 1833. A partir de 1833 tomou o caminho das letras, vindo a falecer
na Corte do Império do Brasil em 1839, como Marechal de Campo do Exército Brasileiro.
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